sexta-feira, 30 de maio de 2008

desejo algarvio

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Quantas vezes desde pequeninos se traça o nosso destino, enovelado numa trama que nos lançaram como rede sobre pescado...


DESEJO ALGARVIO

Tinha um secretíssimo desejo desde criança de tenra idade - quando era tenrinho, quer-se dizer.
Sonhava, desejava ardentemente, ser um Corifeu.
Ouvira a palavra, na voz grave e rouca de tonalidades prenhes de escarro amarelado de tabaco de onça, do seu avô paterno, pela primeira vez, aos 6 anitos de idade e não lhe conhecia o sentido.
Mas desde logo se apaixonou pela bela e sublime sonoridade agreste dela:

— CO-RI-FEU!

Desde esse instante interiorizou que queria ser um corifeu, sem mesmo saber o que isso era. Teria muito tempo para aprender!
Sempre que pensava na palavra as entranhas vibravam-lhe como um carrossel, ou como as rodas da carroça da tia Anica.
E quando a mãe lhe perguntava:

— Anibalzinho, o que queres ser quando fores crescidinho?

De imediato da sua boquinha minúscula e desdentada saltavam as palavras como que cuspidas contra a brisa algarvia, contra o vento quente de Suão:

— Corifeu, mãezinha! Corifeu!

Imagine-se se o avô, ao invés, tive-se dito:

—EUNUCO...


Oeiras, 15 Abril 2006
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